Sobre headcount em empresas de tecnologia - Parte 1
Modelando cenários para a gestão de headcount em uma empresa
“Amateurs talk about tactics, professionals study logistics”
- Anonymous
Um modelo conceitual para visualizar a população de uma empresa
Antes de começarmos a nossa conversa sobre a composição de seniors, plenos e juniores em uma empresa de tecnologia, precisamos visualizar conceitualmente as relações que compõem headcount de uma empresa.
O diagrama abaixo ajuda a descrever essas relações:
Acima: uma visão de estoque e fluxo para a população de funcionários de uma empresa. Fluxo de new joiners ( determinado a partir da capacidade de recrutamento ) aumenta o headcount. Esse headcount é diminuído por meio de turnover ( funcionários que pedem demissão )1. Esses pedidos de demissão ( ou demissões ) acontecem em uma taxa ( turnover rate ) que pode ser calculada pelo número de pessoas que pediram demissão dividido pelo headcount no período.
É importante ressaltar que temos duas variáveis essenciais aqui: a capacidade de recrutamento limita/habilita a quantidade de pessoas que entram na empresa em um período e a taxa de turnover determina como as pessoas deixam de fazer parte da empresa pedindo demissão ou sendo demitidas.
Sendo esta uma visualização agregada sobre o headcount de uma empresa ( ou seja, ela não faz distinção da composição de pessoas mais seniores, pleno ou juniores ), ela serve como um modelo conceitual mas acaba sendo pouco prática para uma discussão mais detalhada.
O próximo diagrama desagrega esse grupo em três: junior/pleno/senior, fazendo agora distinção pelo nível de experiência dos profissionais. Adicionalmente, os profissionais com o passar do tempo adquirem conhecimentos e experiência e evoluem na sua carreira sendo promovidos para o próximo nível.2
Acima: podemos desagregar o estoque headcount em pelo menos três grupos de funcionários: os juniores, os mid level ( pleno ) e os seniores. A progressão de carreira de junior para mid level e de mid level para senior é determinada pelo tempo médio como junior / mid level / senior adquirindo experiência e competência para passar para o próximo nível.
A promoção de junior para pleno, e de pleno para senior depende de um tenure (tempo de maturação ), para simplificar consideramos um tempo médio de serviço entre os níveis, que obviamente varia dependendo do contexto. No geral, uma pessoa consegue evoluir entre junior para pleno mais rápido do que o tempo necessário para que uma pessoa passe de pleno para senior.
Mas independente de quanto tempo se constitui um tenure razoável para as pessoas evoluirem, é importante percebermos que existe um fluxo entre esses grupos, e a população em uma empresa com o tempo vai gradualmente passando de um grupo para o outro, enquanto que novas pessoas vão entrando e saindo da empresa, uma dinâmica que as vezes é difícil de ser capturada integralmente, especialmente se pensarmos sobre ela de maneira linear apenas.
Além disso, podemos desagregar também a entrada de novos funcionários e o turnover de funcionários por experiência considerando, por exemplo, o fluxo de new joiners junior, pleno e senior, assim como o turnover para cada uma dessas populações, inclusive a capacidade de recrutamento e a taxa de turnover de cada uma dessas populações pode variar bastante de uma para a outra.
É razoável assumir que é mais fácil, em um cenário de escassez de talentos, recrutar pessoas com mais experiência por exemplo, por isso a capacidade de recrutamento para um dos grupos é diferente. Assim como é razoável também assumirmos que existem taxas de turnover diferentes para cada um dos grupos.
Juntando todos os pontos acima terminaríamos com algum modelo assim:
Acima: Ao desagregarmos as populações e dividimos entre junior / midlevel / senior podemos visualizar também os fluxos individuais de recrutamento e turnover de cada grupo, assim como a progressão de carreira entre esses levels.
Reparem que o que torna esse tema interessante é a sua natureza dinâmica, os diferentes fluxos de entrada e saídas, assim como os acúmulos nos estoques é o que torna esse tema complexo e com diversas características não lineares.
Qualidade, pirâmide ideal e experiência de funcionários
Uma discussão recorrente sobre o tema de headcount é a quantidade de junior, pleno e seniores que é adequada para o desafio de uma empresa. Obviamente isso varia de empresa para empresa e de contexto para contexto, mas no geral podemos medir essa proporção3 calculando uma razão entre a quantidade de seniores e o headcount total:
seniority ratio = quantidade de seniores / headcount
Por exemplo, em um grupo de 100 funcionários em uma empresa na qual temos 25 seniores temos uma razão de 25%. A discussão rapidamente se volta para: “Qual é a proporção ideal ou ainda qual é o formato de pirâmide ideal?”. Devemos ter muitos juniores, alguns plenos e poucos seniores? Devemos ser mais alongados no mid level, com pouco juniores e seniores e muitos mid level? Devemos ter uma pirâmide invertida, onde existem muitos seniores, alguns mid level e pouquíssimos juniores?
Obviamente não existe uma resposta one size fits all e ela é intimamente conectada ao seu contexto e desafios em mãos. No entanto, ter visibilidade e controle das quantidades e as entradas e saídas ao longo do tempo é uma prática responsável da gestão: você não consegue gerenciar aquilo que não consegue visualizar.
Headcount, a relação com custo e competição por talentos
Adicionalmente a dinâmica de recrutamento, progressão de carreira e turnover, temos a dinâmica de custo de compensação atrelada a cada funcionário para a empresa. É como se existisse um fluxo paralelo entre dois grupos. Vamos analisar esse co-flow na modelagem agregada do nosso problema:
Para cada funcionário recrutado incrementamos o custo com folha de funcionários de maneira diretamente proporcional a sua compensação e regime de contratação, assim como para cada funcionário que deixa de fazer parte da empresa diminuímos o custo com folha, de forma que esses dois grupos possuem comportamentos que se influenciam ao longo do tempo.
É importante ressaltar que o termo compensação aqui é determinada pelo salário que a pessoa recebe mensalmente somado aos benefícios oferecidos pela empresa, assim como algum fator variável por performance ( bônus ) caso o funcionário seja elegível e a empresa ofereça, talvez até algum programa de participação na empresa com ações e stock options, e sobre todos esses custos incide ainda os impostos devidos ao governo e outras determinações das leis trabalhistas.
De maneira análoga aos exercícios anteriores, nós podemos desagregar o diagrama acima pra representar as quantidades, entradas e saídas para cada um dos grupos (junior, pleno e senior) assim como refinar o conceito de salário médio para algo mais próximo da curva real de compensação em uma empresa.
Por último, um modelo mais completo poderia considerar uma variável adicional: a pressão da competição por talentos afeta diretamente a capacidade de recrutamento e simultaneamente aumenta a taxa de turnover da empresa, assim como coloca uma pressão inflacionária nas compensações oferecidas aos funcionários.
O modelo abaixo acaba descrevendo de uma maneira mais integral ( ainda que não seja completa obviamente ) a relação entre recrutamento, turnover, as quantidades de funcionários em cada um dos seus níveis e a relação com o custo de folha em uma empresa de tecnologia:
No próximo artigo da série vamos explorar a relação dinâmica entre todas as essas variáveis no tempo: como essa população vai migrando de júnior para pleno e pleno para sênior? Como isso é equilibrado com o recrutamento e decrescido com o volume de attrition? E qual é o impacto geral da compensação e folha de funcionários neste contexto?
Estou desconsiderando para esta análise o processo de aposentadoria e de falecimento de funcionários, dessa forma, a única maneira de diminuir o headcount de uma empresa no contexto de tecnologia é através do turnover ( perda de funcionários para o mercado ou demissões )
Obviamente existem casos no qual a experiência adquirida não é só determinada pelo tempo, assim como existem pessoas cujo aquisição de experiência e maturidade acontece de maneira acelerada sendo a excessão a regra. Para titulo da nossa modelagem vou aplicar apenas o tempo médio como o fator determinante para que todas as experiências, conhecimentos e oportunidades ocorram para habilitar uma pessoa a sair de junior para pleno e de pleno para senior.
Assumindo que as contratações foram feitas corretamente e as pessoas estão em seus níveis corretos de performance